Eu também já fui brasileiro, já fui moreno como vocês. Já
curti praia não pensava em nada...
Já torci pro Flamengo, gritava seu nome com força e
emoção...
Aprendi nos churrascos, nas mesas dos bares e nas compras
com crediário, que sofrer calado é uma virtude nossa.
Aprendi sendo brasileiro que é melhor não gostar de política
e ser governado por quem adora.
Aprendi a usar meu tempo livre de maneira boçal. Assistindo
Big Brother Brasil e lixo na Tv. Aprendi a não questionar o Jornal e aceitar o
que a Veja diz.
Às vezes dá um pesar muito grande e tento navegar contra a
maré, reclamo no elevador (do calor) e de algum escândalo do Jornal Nacional,
mas, logo passa...
Eu também já fui brasileiro, não dava valor à escola e não
clamava por melhor serviço de saúde. Fui brasileiro também quando recriminei a
greve da PM e aceitei o discurso da Globo.
Sendo brasileiro sou responsável pelas mortes nos hospitais,
pelas balas perdidas e pela corrupção.
Hoje, tento ser Brasileiro. Com B maiúsculo, com opinião
formada. Tento expor minhas ideias nas ruas, mas, não me dão atenção. Hoje
tento ser Brasileiro participo de manifestação, mas, o pior, é receber olhares
desaprovadores e ser xingado por estar lutando. Em breve serei professor e
tentarei nas salas de aula formar Brasileiros. Sei que a luta será difícil,
pois o Estado se contenta com qualquer cidadão, mesmo que seja com “b”
minúsculo.
*Inspirado por Carlos Drummond de Andrade
Tambem já fui
brasileiro
Eu
também já fui brasileiro
Moreno como vocês. Ponteei viola, guiei forde e aprendi na mesa dos bares que o nacionalismo é uma virtude Mas há uma hora em que os bares se fecham e todas as virtudes se negam.
Eu
também já fui poeta.
Bastava olhar para mulher, pensava logo nas estrelas e outros substantivos celestes. Mas eram tantas, o céu tamanho, minha poesia perturbou-se.
Eu
também já tive meu ritmo.
Fazia isto, dizia aquilo. E meus amigos me queriam, meus inimigos me odiavam. Eu irônico deslizava satisfeito de ter meu ritmo. Mas acabei confundindo tudo. Hoje não deslizo mais não, não sou irónico mais não, não tenho ritmo mais não.
De Alguma
poesia (1930)
|